sexta-feira, 25 de outubro de 2019

Recomendação do MP tenta diminuir impacto de corridas de rua em Natal e "clandestinidade"


 Avenida Engenheiro Roberto Freire é palco da Meia Maratona do Sol: impacto no trânsito tem diminuído — Foto: Tiago Lima/Divulgação
As corridas de rua ganharam força em Natal nos últimos anos e dominam a atenção de milhares de admiradores durante todo o ano. A prática esportiva é fundamental para uma melhor qualidade de vida, para a saúde. É fato também que os eventos geram empregos diretos e indiretos, movimentam a economia local, chegam a aquecer o turismo em períodos considerados de baixa estação, mas há situações que incomodam. É preciso lembrar que uma corrida, em muitos casos, trava a cidade e que tem muita gente que não gosta. Este impacto precisa ser reduzido e, pensando nisso, os Ministérios Públicos Federal e Estadual do Rio Grande do Norte publicaram recomendação conjunta para disciplinar a realização destas provas. As modalidades de ciclismo e triatlo, que também necessitam da interdição de vias públicas, também foram inseridas neste processo.
- Essa recomendação surgiu por provocação dos próprios órgãos públicos envolvidos em relação à disciplina de corridas de rua e eventos esportivos nas vias públicas na cidade de Natal. A Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana, a Polícia Rodoviária Federal e outros órgãos procuraram o Ministério Público justamente para que a gente pudesse dar o apoio ao disciplinamento das corridas de rua na cidade. Na época, as corridas eram realizadas com uma certa desorganização em relação ao agendamento, os organizadores apresentavam os projetos muito em cima da hora e não existia um tempo hábil para que os órgãos públicos pudessem analisar a viabilidade destas corridas e os locais que iriam se realizar - conta o promotor de Justiça Leonardo Cartaxo.
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A primeira medida indica que é preciso apresentar um projeto base do evento, incluindo percurso e horário, com no mínimo 60 dias de antecedência. De acordo com Leonardo Cartaxo, a saúde e a segurança do consumidor, "fundamentos muito importantes trazidos pelo Código de Defesa do Consumidor", estão em primeiro lugar e garantiu que o MP está sempre vigilante neste aspecto.
- Existiam algumas corridas com total empirismo, amadorismo, sem nenhuma autorização. Isso aí coloca em risco principalmente os corredores, que vão correr em vias que estão com trânsito aberto, pondo em risco todos os usuários da via pública. A recomendação buscou reduzir esses riscos de acidentes e qualquer intercorrência com quem está lá fazendo sua atividade física - detalha.
O que diz a recomendação do MPRN e do MPF
Que os organizadores de corrida de rua:
-Apresentem de projeto base, incluindo o percurso e o horário, com no mínimo 60 dias de antecedência do evento, aos departamentos de fiscalização competentes pela via, para saber da disponibilidade de atendimento do percurso, devendo a documentação ser emitida pelo respectivo departamento em até 7 dias, ficando a sua publicidade ficar condicionada a pré aprovação do projeto;
-Registrem do evento na Federação respectiva, devendo na ocasião apresentar a documentação expedida pelos departamentos de fiscalização, para obter o documento comprobatório de registro;
-Apresentem ao órgão competente pela via, com no 30 dias de antecedência, os seguintes documentos: solicitação de autorização do evento; o "de acordo" emitido pela fiscalização; registro na Federação; autorização da Semurb; projeto de intervenção com planta e memorial; projeto do evento; e o material para divulgação do evento e dos desvios.
-Apresentem à fiscalização de trânsito responsável pela via (PRF, PM ou STTU), a liberação de intervenção e entreguem a autorização de interdição no prazo mínimo de 7 dias antes do evento;
-Fixem faixas nas vias que serão temporariamente interditadas, no prazo de 7 dias antes da data de realização do evento, devendo ainda comunicar aos condomínios, hotéis ou outras unidades que comportem grande aglomeração de pessoas, por meio de ofício ou e-mail. As faixas a que se refere este item deverão indicar o organizador responsável e ser retiradas no prazo máximo de 48 horas após a realização do evento.
-As corridas de rua se realizarão nos finais de semana e feriados (Federal, Estadual e Municipal), e durante a semana somente poderão ocorrer após as 20h nas rodovias estaduais;
-Para que obedeçam as seguintes condições: não haja dois eventos no mesmo dia, ou final de semana sobre a responsabilidade exclusiva ou compartilhada do mesmo ente (União/Estado/Município);
-As corridas de rua deverão atender aos critérios estabelecidos por cada órgão, levando-se em consideração a quantidade mínima estabelecida de membros da Polícia Militar – Unidade de trânsito do RN, Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana (STTU), Polícia Rodoviária Federal (PRF);
-O Custo Operacional para a realização do evento ficará de acordo com a legislação própria de cada instituição responsável pela via.
-As vias autorizadas para as corridas de rua correspondem à BR 101 Sul e Norte (Via Federal), delimitando-se esta da seguinte forma: BR101/SUL: até a cidade satélite (KM100) e BR101/NORTE: trevo de acesso ao município de Touros (KM87); Rota do Sol (RN 063), Avenida Engenheiro Roberto Freire, Via Costeira (Sen. Dinarte Mariz) – (RN 301), Avenida Prefeito Omar O`Grady (prolongamento da Prudente de Morais);
-Deverá ser realizada uma consulta ao órgão competente a fim de se obter informação quanto as vias autorizadas no âmbito das Vias Municipais, exceto no que se refere à Avenida Senador Salgado Filho, Avenida Bernardo Vieira e Avenida Governador Antônio de Melo Souza (Pompéia) que não poderão ser utilizadas para as corridas de rua.
Fonte: Diário Oficial do Estado

O promotor ainda destacou que anteriormente não existia nenhuma regulamentação quanto à comunicação das interdições das vias. O aviso prévio sobre rotas alternativas é importante para que as pessoas possam usufruir do direito constitucional de ir e vir.
Faixas para comunicar corridas de rua são obrigatórias na recomendação: informar para quem não vai correr — Foto: Augusto Gomes/GloboEsporte.com
- Um ponto muito importante da recomendação era fazer com que os organizadores das provas, notadamente na semana que antecede a prova, colocassem faixas nas vias que serão interditadas, informando o dia e o período do dia que a via ficará interditada. Justamente para que os moradores tomem ciência de que naquele determinado dia eles não poderão atravessar o carro e se locomover naquele caminho - disse.
O promotor lembra que a recomendação - publicada no Diário Oficial do Estado em 5 de setembro de 2017 - foi construída por muitas mãos e que os organizadores dos principais eventos e presidentes de federações das modalidades envolvidas também participaram de encontros.
- Essa recomendação é fruto de uma discussão de todos. Tudo que está estabelecido foi originado dessa construção, com a participação também dos que organizam as provas, justamente para evitar qualquer discussão futura - conclui o promotor.[

Contra a clandestinidade

"Tem várias corridas em Natal, acredito que 90% delas, que não estão cumprindo estas normas.Com relação a estas medidas, acho até que deveria ter mais. Isto dá segurança ao atleta".

A declaração é de Nivaldo Pereira, organizador da Meia Maratona do Sol e diretor da HC Sports, que participou do processo de formulação da recomendação à época.
- A medida é muito boa porque ela faz com que o aventureiro, o ilegal, o clandestino não opere. Tem algumas exigências que fazem com que você trabalhe de forma legal, correta, pela segurança de todos. O problema, para mim, é que o Ministério Público coloca as regras, mas só fiscaliza através da denúncia. Acho que não deveria ser assim - completou.
Stenio Bezerra é presidente da Federação de Triathlon do Rio Grande do Norte (Fetrirn) e também organiza corridas de rua. Para ele, a recomendação é correta para quem anda na linha.
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- Nós que fazemos as coisas como devem ser feitas fomos mais orientados, e existe um passo a passo agora a seguir, o que facilita quando vai se pedir a autorização para uma corrida - disse.
O empresário, proprietário da Hi Sports, conta que o custo com as licenças das provas aumentou, mas não vê isso como problema. Pelo contrário.
- Gerou um custo a mais, mas ele é diluído ao longo do ano para quem faz eventos. Isto não protege só o corredor e os próprios órgãos de trânsito, que às vezes eram alvos de críticas da população, mas protege a gente como organizador. Cumprindo todas as determinações, estaremos resguardados - ressalta.
E o que estes "clandestinos" fazem para burlar as regras definidas na recomendação?
- Largam em horários muito cedo, às 3h, 4h, quando a maioria das pessoas está dormindo e tem pouco movimento. E também têm o costume de mudar o nome. Em vez de corrida, usam 'treinão', 'desafio'. É uma maneira de se tirar o título de corrida para que não entre no que é apontado pela recomendação - revela Stenio.
Estas provas não regularizadas geralmente são as que mais geram transtornos, justamente por não atingirem a comunidade quanto às interdições.
- O que o camarada reclama é no dia que sai de casa e vê tudo fechado; acontece muito com as corridas pequenas, com este pessoal que está na clandestinidade, que não tem regulamentação nenhuma. Eles não usam nenhum canal de comunicação. Se confiam que uma mensagem no grupo de WhatsApp vai se espalhar pela cidade toda. E não vai. Tem que haver essa fiscalização para que as pessoas sejam obrigadas a cumprir regras, mas também informar aqueles que não correm - relata Nivaldo Pereira.
Diminuição de impactos
Stenio lembra que, ao projetar um evento esportivo em via pública, tem que se pensar no trânsito e no impacto que vai causar na população que não quer correr. A ideia é tornar o evento mais simpático aos olhos da população, ao mesmo tempo que é priorizada a segurança do atleta "não só durante o evento, mas no antes e depois, no fechamento das ruas, no planejamento de onde vai correr".
- Este foi um dos primeiros pontos levantados quando a gente foi chamado para contribuir com essa recomendação. As pessoas fechavam as ruas, faziam eventos em todas as horas, e isso atrapalhava quem morava em determinado local, além do próprio comércio - conta.
Nivaldo Pereira reforça este pensamento de tratar com bastante atenção quem não corre. Para isso, ele crê que as exigências têm que aumentar cada vez mais "para que cheguem ao nível que a gente tenha a certeza de que o cidadão que não está correndo vai ser informado para que ele possa se preparar e não seja 'atrapalhado' pela corrida também".
- Estas pessoas que não correm têm que ser impactadas o mínimo possível para não criarmos um monstro contra a corrida. Se o camarada for sair de casa e tiver uma corrida todo sábado, todo domingo, ele vai criar uma antipatia pelo esporte - declarou o diretor da HC Sports.
Federação não tem poder de fiscalização
A presidente da Federação Norte-rio-grandense de Atletismo, também destacou a importância da recomendação conjunta dos Ministérios Públicos do Rio Grande do Norte e Federal, mas aponta a necessidade de uma maior divulgação para que chegue a mais promotores de eventos - este é também um dos objetivos desta reportagem do GloboEsporte.com.
- Nós que estamos sempre acompanhando as corridas temos esse pensamento que não chegou ao conhecimento de todos. A gente tem que passar por um processo de levar informação para formar essas pessoas de como conduzir um evento no meio da rua sem prejudicar os moradores e assegurar a integridade física de quem participa, fazer algo que satisfaça, que as pessoas sintam o prazer de voltar a participar destes eventos - falou.
Esta falta de conhecimento é um dos fatores principais para a clandestinidade. Magnólia lembra que "quem libera ou não o evento é o trânsito e a federação orienta toda a parte técnica, administrativa". A FNA, mesmo sendo a entidade responsável pelo desenvolvimento da modalidade, não tem poder de fiscalizar e punir os organizadores das provas que não estão legalizadas.
- A gente acompanha diariamente as corridas clandestinas, e o Ministério Público estava notificando a federação. Nós não temos poder de polícia para impedir. Se elas (corridas) estão acontecendo é porque existe uma autorização de quem vai interditar. Quem autoriza é somente o órgão de trânsito - conta Magnólia.
- Nós não podemos ser punidos por isso, sendo notificados porque essas corridas estão acontecendo e não tomamos uma posição. Nenhuma corrida, nem treino, pode acontecer se não tiver o aval dos órgãos de trânsito - emenda.
Avenida Engenheiro Roberto Freire é palco da Meia Maratona do Sol: impacto no trânsito tem diminuído — Foto: Tiago Lima/Divulgação
Quanto aos impactos causados pelas corridas de rua, Magnólia lamenta que Natal não possua vias apropriadas para esta prática - no Nordeste, por exemplo, João Pessoa e Recife usam a orla como palco e não influencia tanto no trânsito da cidade. Para ela, é necessário buscar espaços que incomodem o mínimo possível os moradores.
- Natal não dispõe ainda de corredores, de espaços que as pessoas façam a prática da corrida de rua. Nós temos muita carência disso. Então, a gente precisa muito contar com a população para entender que a gente precisa interditar as vias, sem causar tantos transtornos - lembra.
Ainda sobre a recomendação, a presidente da federação afirma que precisa de algumas atualizações, ajustes necessários para que atenda o maior número de promotores de eventos. Ela acredita que pode se rever o prazo de 60 dias, já que os recursos de algumas provas geralmente vêm das inscrições; e o fato de não poder haver mais de um evento no fim de semana.



noticia completa no g1.rn (globoesporte.com)

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