As corridas de rua ganharam força em Natal
nos últimos anos e dominam a atenção de milhares de admiradores durante todo o
ano. A prática esportiva é fundamental para uma melhor qualidade de vida, para
a saúde. É fato também que os eventos geram empregos diretos e indiretos,
movimentam a economia local, chegam a aquecer o turismo em períodos
considerados de baixa estação, mas há situações que incomodam. É preciso
lembrar que uma corrida, em muitos casos, trava a cidade e que tem muita gente
que não gosta. Este impacto precisa ser reduzido e, pensando nisso, os
Ministérios Públicos Federal e Estadual do Rio Grande do Norte publicaram
recomendação conjunta para disciplinar a realização destas provas. As
modalidades de ciclismo e triatlo, que também necessitam da interdição de vias
públicas, também foram inseridas neste processo.
- Essa recomendação
surgiu por provocação dos próprios órgãos públicos envolvidos em relação à
disciplina de corridas de rua e eventos esportivos nas vias públicas na cidade
de Natal. A Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana, a Polícia Rodoviária
Federal e outros órgãos procuraram o Ministério Público justamente para que a
gente pudesse dar o apoio ao disciplinamento das corridas de rua na cidade. Na
época, as corridas eram realizadas com uma certa desorganização em relação ao
agendamento, os organizadores apresentavam os projetos muito em cima da hora e
não existia um tempo hábil para que os órgãos públicos pudessem analisar a
viabilidade destas corridas e os locais que iriam se realizar - conta o
promotor de Justiça Leonardo Cartaxo.
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A primeira medida
indica que é preciso apresentar um projeto base do evento, incluindo percurso e
horário, com no mínimo 60 dias de antecedência. De acordo com Leonardo Cartaxo,
a saúde e a segurança do consumidor, "fundamentos muito importantes
trazidos pelo Código de Defesa do Consumidor", estão em primeiro lugar e
garantiu que o MP está sempre vigilante neste aspecto.
- Existiam algumas
corridas com total empirismo, amadorismo, sem nenhuma autorização. Isso aí
coloca em risco principalmente os corredores, que vão correr em vias que estão
com trânsito aberto, pondo em risco todos os usuários da via pública. A
recomendação buscou reduzir esses riscos de acidentes e qualquer intercorrência
com quem está lá fazendo sua atividade física - detalha.
O que
diz a recomendação do MPRN e do MPF
Que os
organizadores de corrida de rua:
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-Apresentem de projeto base,
incluindo o percurso e o horário, com no mínimo 60 dias de antecedência do
evento, aos departamentos de fiscalização competentes pela via, para saber da
disponibilidade de atendimento do percurso, devendo a documentação ser emitida
pelo respectivo departamento em até 7 dias, ficando a sua publicidade ficar
condicionada a pré aprovação do projeto;
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-Registrem do evento na Federação
respectiva, devendo na ocasião apresentar a documentação expedida pelos
departamentos de fiscalização, para obter o documento comprobatório de
registro;
|
-Apresentem ao órgão competente pela
via, com no 30 dias de antecedência, os seguintes documentos: solicitação de
autorização do evento; o "de acordo" emitido pela fiscalização;
registro na Federação; autorização da Semurb; projeto de intervenção com
planta e memorial; projeto do evento; e o material para divulgação do evento
e dos desvios.
|
-Apresentem à fiscalização de
trânsito responsável pela via (PRF, PM ou STTU), a liberação de intervenção e
entreguem a autorização de interdição no prazo mínimo de 7 dias antes do
evento;
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-Fixem faixas nas vias que serão
temporariamente interditadas, no prazo de 7 dias antes da data de realização
do evento, devendo ainda comunicar aos condomínios, hotéis ou outras unidades
que comportem grande aglomeração de pessoas, por meio de ofício ou e-mail. As
faixas a que se refere este item deverão indicar o organizador responsável e
ser retiradas no prazo máximo de 48 horas após a realização do evento.
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-As corridas de rua se realizarão
nos finais de semana e feriados (Federal, Estadual e Municipal), e durante a
semana somente poderão ocorrer após as 20h nas rodovias estaduais;
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-Para que obedeçam as seguintes
condições: não haja dois eventos no mesmo dia, ou final de semana sobre a
responsabilidade exclusiva ou compartilhada do mesmo ente
(União/Estado/Município);
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-As corridas de rua deverão atender
aos critérios estabelecidos por cada órgão, levando-se em consideração a
quantidade mínima estabelecida de membros da Polícia Militar – Unidade de
trânsito do RN, Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana (STTU), Polícia Rodoviária
Federal (PRF);
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-O Custo Operacional para a
realização do evento ficará de acordo com a legislação própria de cada
instituição responsável pela via.
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-As vias autorizadas para as
corridas de rua correspondem à BR 101 Sul e Norte (Via Federal),
delimitando-se esta da seguinte forma: BR101/SUL: até a cidade satélite
(KM100) e BR101/NORTE: trevo de acesso ao município de Touros (KM87); Rota do
Sol (RN 063), Avenida Engenheiro Roberto Freire, Via Costeira (Sen. Dinarte
Mariz) – (RN 301), Avenida Prefeito Omar O`Grady (prolongamento da Prudente
de Morais);
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-Deverá ser realizada uma consulta
ao órgão competente a fim de se obter informação quanto as vias autorizadas
no âmbito das Vias Municipais, exceto no que se refere à Avenida Senador
Salgado Filho, Avenida Bernardo Vieira e Avenida Governador Antônio de Melo
Souza (Pompéia) que não poderão ser utilizadas para as corridas de rua.
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Fonte:
Diário Oficial do Estado
O promotor ainda
destacou que anteriormente não existia nenhuma regulamentação quanto à
comunicação das interdições das vias. O aviso prévio sobre rotas alternativas é
importante para que as pessoas possam usufruir do direito constitucional de ir
e vir.
Faixas para comunicar corridas de rua são
obrigatórias na recomendação: informar para quem não vai correr — Foto: Augusto
Gomes/GloboEsporte.com
- Um ponto muito
importante da recomendação era fazer com que os organizadores das provas,
notadamente na semana que antecede a prova, colocassem faixas nas vias que
serão interditadas, informando o dia e o período do dia que a via ficará
interditada. Justamente para que os moradores tomem ciência de que naquele
determinado dia eles não poderão atravessar o carro e se locomover naquele
caminho - disse.
- Essa recomendação
é fruto de uma discussão de todos. Tudo que está estabelecido foi originado
dessa construção, com a participação também dos que organizam as provas,
justamente para evitar qualquer discussão futura - conclui o promotor.[
Contra a clandestinidade
"Tem
várias corridas em Natal, acredito que 90% delas, que não estão cumprindo estas
normas.Com relação a estas medidas, acho até que deveria ter mais. Isto dá
segurança ao atleta".
A declaração é de
Nivaldo Pereira, organizador da Meia Maratona do Sol e diretor da HC Sports,
que participou do processo de formulação da recomendação à época.
- A medida é muito
boa porque ela faz com que o aventureiro, o ilegal, o clandestino não opere.
Tem algumas exigências que fazem com que você trabalhe de forma legal, correta,
pela segurança de todos. O problema, para mim, é que o Ministério Público
coloca as regras, mas só fiscaliza através da denúncia. Acho que não deveria
ser assim - completou.
Stenio Bezerra é
presidente da Federação de Triathlon do Rio Grande do Norte (Fetrirn) e também
organiza corridas de rua. Para ele, a recomendação é correta para quem anda na
linha.
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- Nós que fazemos as
coisas como devem ser feitas fomos mais orientados, e existe um passo a passo
agora a seguir, o que facilita quando vai se pedir a autorização para uma
corrida - disse.
O empresário,
proprietário da Hi Sports, conta que o custo com as licenças das provas
aumentou, mas não vê isso como problema. Pelo contrário.
- Gerou um custo a
mais, mas ele é diluído ao longo do ano para quem faz eventos. Isto não protege
só o corredor e os próprios órgãos de trânsito, que às vezes eram alvos de
críticas da população, mas protege a gente como organizador. Cumprindo todas as
determinações, estaremos resguardados - ressalta.
E o que estes
"clandestinos" fazem para burlar as regras definidas na recomendação?
- Largam em horários
muito cedo, às 3h, 4h, quando a maioria das pessoas está dormindo e tem pouco
movimento. E também têm o costume de mudar o nome. Em vez de corrida, usam
'treinão', 'desafio'. É uma maneira de se tirar o título de corrida para que
não entre no que é apontado pela recomendação - revela Stenio.
Estas provas não
regularizadas geralmente são as que mais geram transtornos, justamente por não
atingirem a comunidade quanto às interdições.
- O que o camarada
reclama é no dia que sai de casa e vê tudo fechado; acontece muito com as
corridas pequenas, com este pessoal que está na clandestinidade, que não tem
regulamentação nenhuma. Eles não usam nenhum canal de comunicação. Se confiam
que uma mensagem no grupo de WhatsApp vai se espalhar pela cidade toda. E não
vai. Tem que haver essa fiscalização para que as pessoas sejam obrigadas a
cumprir regras, mas também informar aqueles que não correm - relata Nivaldo
Pereira.
Diminuição de impactos
Stenio lembra que,
ao projetar um evento esportivo em via pública, tem que se pensar no trânsito e
no impacto que vai causar na população que não quer correr. A ideia é tornar o
evento mais simpático aos olhos da população, ao mesmo tempo que é priorizada a
segurança do atleta "não só durante o evento, mas no antes e depois, no
fechamento das ruas, no planejamento de onde vai correr".
- Este foi um dos
primeiros pontos levantados quando a gente foi chamado para contribuir com essa
recomendação. As pessoas fechavam as ruas, faziam eventos em todas as horas, e
isso atrapalhava quem morava em determinado local, além do próprio comércio - conta.
Nivaldo Pereira
reforça este pensamento de tratar com bastante atenção quem não corre. Para
isso, ele crê que as exigências têm que aumentar cada vez mais "para que
cheguem ao nível que a gente tenha a certeza de que o cidadão que não está
correndo vai ser informado para que ele possa se preparar e não seja
'atrapalhado' pela corrida também".
- Estas
pessoas que não correm têm que ser impactadas o mínimo possível para não
criarmos um monstro contra a corrida. Se o camarada for sair de casa e tiver
uma corrida todo sábado, todo domingo, ele vai criar uma antipatia pelo esporte
- declarou o diretor da HC Sports.
Federação não tem poder de fiscalização
A presidente da
Federação Norte-rio-grandense de Atletismo, também destacou a importância da
recomendação conjunta dos Ministérios Públicos do Rio Grande do Norte e
Federal, mas aponta a necessidade de uma maior divulgação para que chegue a
mais promotores de eventos - este é também um dos objetivos desta reportagem
do GloboEsporte.com.
- Nós que estamos
sempre acompanhando as corridas temos esse pensamento que não chegou ao
conhecimento de todos. A gente tem que passar por um processo de levar
informação para formar essas pessoas de como conduzir um evento no meio da rua
sem prejudicar os moradores e assegurar a integridade física de quem participa,
fazer algo que satisfaça, que as pessoas sintam o prazer de voltar a participar
destes eventos - falou.
Esta falta de
conhecimento é um dos fatores principais para a clandestinidade. Magnólia
lembra que "quem libera ou não o evento é o trânsito e a federação orienta
toda a parte técnica, administrativa". A FNA, mesmo sendo a entidade
responsável pelo desenvolvimento da modalidade, não tem poder de fiscalizar e
punir os organizadores das provas que não estão legalizadas.
- A
gente acompanha diariamente as corridas clandestinas, e o Ministério Público
estava notificando a federação. Nós não temos poder de polícia para impedir. Se
elas (corridas) estão acontecendo é porque existe uma autorização de quem vai
interditar. Quem autoriza é somente o órgão de trânsito - conta Magnólia.
- Nós não podemos
ser punidos por isso, sendo notificados porque essas corridas estão acontecendo
e não tomamos uma posição. Nenhuma corrida, nem treino, pode acontecer se não
tiver o aval dos órgãos de trânsito - emenda.
Avenida Engenheiro Roberto Freire é palco da Meia
Maratona do Sol: impacto no trânsito tem diminuído — Foto: Tiago
Lima/Divulgação
Quanto aos impactos
causados pelas corridas de rua, Magnólia lamenta que Natal não possua vias
apropriadas para esta prática - no Nordeste, por exemplo, João Pessoa e Recife
usam a orla como palco e não influencia tanto no trânsito da cidade. Para ela,
é necessário buscar espaços que incomodem o mínimo possível os moradores.
- Natal não dispõe
ainda de corredores, de espaços que as pessoas façam a prática da corrida de
rua. Nós temos muita carência disso. Então, a gente precisa muito contar com a
população para entender que a gente precisa interditar as vias, sem causar
tantos transtornos - lembra.
Ainda sobre a
recomendação, a presidente da federação afirma que precisa de algumas
atualizações, ajustes necessários para que atenda o maior número de promotores
de eventos. Ela acredita que pode se rever o prazo de 60 dias, já que os
recursos de algumas provas geralmente vêm das inscrições; e o fato de não poder
haver mais de um evento no fim de semana.
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